O menino negro [resenha]
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O menino negro [resenha]

Atualizado: 23 de mai. de 2023

Quando eu termino um livro, preciso escrever a resenha logo em seguida para não me esquecer nem do enredo nem do que senti durante a leitura. Acabei de terminar "O menino negro", escrito por Camara Laye aos 25 anos, enquanto ele ainda morava na França. O livro foi lançado em 1953.

A obra é um relato de memória em que o autor narra episódios da sua infância e adolescência na Guiné Francesa (atualmente, a República da Guiné), terminando com o dia de sua partida para a França, em 1946, para cursar a faculdade de engenharia mecânica. O livro não é escrito necessariamente em ordem cronológica e não narra acontecimentos diários da vida do autor, mas foca principalmente no relato de episódios mais marcantes de sua vida, como a entrada na escola, as férias na casa da avó, o ritual de circuncisão, a mudança para a capital Conacri onde fez o Ensino Técnico.


É um livro muito sensível que fala sobre amadurecimento, sobre a relação com a família e, sobretudo, sobre a cultura africana; tão repleta de símbolos e misticidade. A família de Laye é muçulmana, por isso o livro também traz questões ligadas a essa religião; como a vestimenta e a poligamia.


Em "O menino negro", porém, percebemos uma maior preocupação do autor não com a precisão dos fatos de sua vida pregressa, mas com o modo com que são narrados, no sentido de proporcionar ao leitor uma experiência estética fluida, por meio de uma linguagem que nos aproxima da oralidade e do universo dos mitos e lendas africanos da Guiné. É justamente essa maior preocupação com a linguagem e a estética que diferencia a memória da autobiografia. (trecho retirado do manual do professor - veja documento completo abaixo)

É um livro pequeno, de leitura rápida e fácil que aborda vários temas interessantes para serem trabalhados em sala de aula. Meu único "porém" em relação a leitura desse livro na escola é o fato da linguagem ser um pouco difícil, principalmente no início do livro, o vocabulário é meio rebuscado demais e há várias palavras de difícil compreensão para alunos do 8º e 9º anos - séries para as quais a editora indica a adoção da obra. A história também pode demorar para cativar os jovens leitores - eu mesma só fui fisgada pela obra, de verdade, na segunda metade - o que vai exigir um trabalho maior de professores e professoras para cativar os estudantes.


Importante lembrar que este livro se enquadra no cumprimento da Lei 11.645/2008, que torna obrigatória a inclusão da História e da Cultura Afro-brasileira e Indígena nos currículos das escolas brasileiras.


Alguns temas que podem ser trabalhados nas aulas de leitura deste livro:

Rituais de introdução dos meninos à vida adulta: Camara Laye passa por um longo ritual aos 14 anos, que culmina na circuncisão e marca sua passagem para a vida de homem. Por isso, é possível comparar esta parte da história com rituais de passagem para a vida adulta presentes em outras culturas, como a judaica e algumas etnias indígenas.

Comparação entre a vida no campo e na capital: ao 15 anos, o autor mudou-se para Conacri, a capital da Guiné Francesa, e é possível ver as diferenças (e até semelhanças) entre a vida da sua família na cidade de Kouroussa, ainda muito rural, e a vida da família do tio na capital.

O papel da educação na vida de Camara Laye: o autor mudou-se duas vezes para conseguir continuar seus estudos e isso pode gerar uma boa discussão sobre o acesso à educação de qualidade não só em países africanos, mas também em nosso próprio país.

A misticidade, as lendas e os mitos da cultura africana: em diversos momentos, Camara Laye narra acontecimentos que, aos nossos olhos ocidentais, podem parecer fantasiosos demais, quase impossíveis de serem reais - como quando o seu pai conversa com uma cobra ou entra em contato com os deuses para exercer seu trabalho como ourives. Este encontro com o outro, com um modo de viver tão diferente do nosso, também pode gerar boas discussões e acho também passível de ser comparado aos rituais, lendas e mitos indígenas.


Compartilho também alguns materiais que encontrei sobre o livro.

O manual do professor publicado pela editora Companhia das Letras.

O menino negro - manual do prof
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Na seção PARA LER NA ESCOLA, você vai sempre encontrar resenhas de livros literários (também conhecidos como paradidáticos) que são adequados para ler com os alunos do Ensino Fundamental 2. Também haverá sugestões de atividades, exercícios e temas que podem ser trabalhados com os alunos durante a leitura.

 

O MENINO NEGRO

Camara Laye

Lançado em 2013, 160 p.

Editora Seguinte


O menino negro narra a infância e adolescência de um garoto comum, mas, ao mesmo tempo, muito diferente. Como todos nós, ele se diverte no quintal de casa, vai à escola, brinca e briga com os amigos. No entanto, ele também vivencia um dia a dia totalmente distinto: teme e respeita as cobras que insistem em compartilhar o terreno de seus pais, passa por um ritual coletivo de circuncisão aprendendo a lidar com seu corpo, estuda numa escola corânica e recebe uma formação muçulmana a seiscentos quilômetros de sua terra natal. Seu destino final é Paris, cidade iluminada que o converte em escritor.

O livro que o leitor tem nas mãos traz o ambiente único da Alta Guiné, mas é também uma homenagem a um continente durante muito tempo esquecido. São muitas as Áfricas que hoje começamos a conhecer, e esta, contada com tanta sensibilidade por Camara Laye, é daquelas que não se esquece jamais.


Indicado para: 8º e 9º anos (indicação do catálogo da editora)

Temas: amadurecimento, conflitos da adolescência, cultura africana, encontros com a diferença, religião, sociedade e cidadania.

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